2.8.11

Nuvens

Nuvens

Já disseram que eram feitas de algodão
Mas eu acho que não
E falaram que eram mágoas
De cima ou de baixo veio tanta água?

Numa eu vi uma bola
Joana, um carrapato a esmo
Francisco, o olho do dinossauro
E Marcela não viu nada, só nuvem mesmo

Lembra-me o cabelo de Walmor Chagas
A laranjada, Deus me perdoe
Incêndio na floresta
Nuvem negra é ovelha manca da insônia

Aquela ali escura, carregada
Lá adiante uma clara, fofinha, arregalada
Outra ligeira camada de fumaça
Quando começarão a derrocada?

Um balão atravessa o verniz etéreo
Outro avião rompe a massa amorfa
Sócrates fica ali no meio, desviando-se de tudo
Antigamente seu condomínio era mais seguro

Não quero morar nas nuvens
Ainda que me custe a licença poética
Mas é lá onde se paga, não é boato
Aluguel mais barato

E disseram que a tal negociação
Era nebulosa
Mas as que se fazem cá na terra, ao meio dia
Eminência parda, colarinho branco, vaca fria

Explicações do ciclo da vida
Terra e Gaia, evaporar-se das águas
Só para depois, densas, banhar-nos em bica
O que, afinal, precisamente, as justifica?

Suas conchas, revoltas e compartimentos
Recôncavos dos apaixonados e ansiosos
Servem - servem? - para recordarmos, pasmos
Noves fora zero: somos nós os nebulosos

Que a língua nos impeça de chover
Vá lá, aceitamos com um calmante
Mas que a física nos dificulte sublimar
Isto sim, é inquietante

É que somos densos, híbridos
Pretensiosos, confusos, voluntariosos demais...
Mas temos sex appeal - arre!
E outros dons da carne...

"Do Vidigal se vê o mar e as ilhas"
O sublime visto com pés e nuca na areia
Fazer as contas é não dar nó sem ponto:
Melhor - por ora - o chão e pronto.

Um comentário:

Julie disse...

Lindo. Sutil, leve como uma nuvem. Forte... Amei!