Quando precisei de sabedoria fiquei em silêncio,
Busquei os mestres da meditação, os livros de auto-ajuda,
Experimentei temperos e tentei posturas do yoga,
Traduzi livros de línguas arcaicas e consultei dicionários on-line
Escrevi sem me dar conta de mim mesmo
E busquei a via do excesso
Mas...
Quando precisei de sabedoria corri e gritei,
Busquei bálsamos para o corpo e calma,
Banhos de lama, incensos, ofurôs e cirurgiões plásticos,
Shi-atsu, quiropráticos, madames das casas de tolerância,
Conselheiros, poetas, religiosos e cientistas
Tornei-me um ermitão, um cínico
Mas nada...
Quando precisei de sabedoria fiz aulas de canto,
Viajei pela Ásia, aprendi a cozinhar, reli os clássicos,
Visitei sarcófagos e o Taj Mahal, senti inveja, asco,
Perdoei-me e despi-me, senti calor, frio, cansaço,
Arrependi-me e confessei-me, senti alívio passageiro,
Procurei isolar-me no conhecimento e não atendi o telefone
Mas nada me salvou...
Quando precisei de sabedoria visitei um cemitério,
Levei flores e água benta, tentei aprender a rezar,
Alonguei-me, corri de bicicleta e, olhos fechados, soltei as mãos
Olhei para além do sujeito no espelho e o inquiri,
Vomitei meu orgulho e reaprendi lições de esperança,
Candidatei-me a prefeito e perdi a eleição
Mas nada me salvou do inferno...
Quando precisei de sabedoria busquei um golpe último,
E recordei-me da infância e das pessoas sábias de outrora,
E do sorriso largo de quem me acolheu com alma aberta,
Das lições de caligrafia e do carinho que é ser abraçado,
Resgatei a alquimia do olhar e, fôlego único, engoli minhas mágoas
Escarafunchei, nas lembranças, o poder de transformar o real
Mas nada me salvou do inferno que é conviver...
Daí que há sabedoria em quem, talvez supra-humano,
Talvez nossa própria carne empilhada em circuitos nervosos
Nos deixou sem outras oportunidades de buscar sabedoria
Além dos caminhos tortuosos e espinhosos
Rumo a admitir, desolada ou assertivamente,
Que a salvação do inferno que é conviver, amar e fenecer
É só esta mesma: conviver, amar e fenecer.
9 comentários:
Hamertz,
Sabedoria realmente não deveria ser buscada em momentos de crise; ela deveria ser cultivada como quem escreve um livro, este que não pode ser aberto antes de ser escrito.
E escrever é isso, empilhar nossa carne em circuitos nervosos, enervar circuitos em nossa pilhas de carne, encarnar nossas pilhas de nervos em circuitos sem nome.
Sabedoria é o nome que se dá às palavras que trazem calor nos dias de frio. Viver é jamais saber. Lindo texto.
abs,
Chuí
Contundente & contumaz.
Sabedoria é isso. Tocar a alma com palavras certas.
Lindo texto!
Rosa
Hamer
Talvez haja uma gradação: dado, informação conhecimento, inteligência, sabedoria. Na falta desta última, há circunstâncias em que as demais não bastam.
Aí é preciso ser zen, especialmente zen pressa...
Abraço
Menezes
Menezes,
Zen pressa foi ótimo!
Abraço,
Hamer
Chuí,
Buscar a sabedoria é como rezar: a gente se lembra mesmo quando o calo aperta. Apesar de o melhor ser no dia-a-dia, zen pressa.
Abç,
Hamer
que bom estava sentindo falta
Hamer,
Obrigada por partilhar seus pensamentos, reflexões e criações!
Continuo aprendendo com vc.
Abraços
Jumara
Texto exurbitante neste blogue, visões assim destacam ao indivíduo que reflectir neste blog .....
Faz muito mais do teu web site, aos teus leitores.
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